Rogéria Araújo
Jornalista da Adital
fonte: Adital
Indubitavelmente,
no atual marco político e independente latino-americano, a Venezuela – através
de seu presidente Hugo Chávez Frías – reacendeu a chama bolivariana no continente,
no caminho da unidade pela qual tanto lutou Simón Bolívar. Em meio a um cerco
midiático de oposição e os claros interesses das classes dominantes, a nação
venezuelana segue dando exemplo de como se manter erguida contra a hegemonia
injusta e opressora.
Chávez
foi eleito legitimamente pelo povo em outubro passado, mas não compareceu à
cerimônia de posse, pois permanece em Cuba, onde se recupera de procedimentos
cirúrgicos relacionados a um câncer. Mais uma vez, a guerra midiática se
acirrou e uma foto plantada pelo jornal El País, na qual um paciente é
registrado entubado, serviu de motivos para mais alardes sobre a saúde do
presidente.
Mesmo
com as manobras orquestradas pela oposição, a Suprema Corte decidiu que, por
direito, Chávez poderia ter sua posse adiada. E assim está sendo.
A Adital conversou com o educador e analista político nicaraguense, Ricardo
Zúniga, integrante da Rede Universitária de Pesquisadores sobre a América
Latina, com sede no Ceará (Brasil), sobre a conjuntura venezuelana e sua
importante repercussão para o mundo.
Adital - A
Venezuela sempre protagonizou o que se pode chamar de guerra midiática com
relação a vários assuntos envolvendo o presidente Hugo Chávez. Mas parece que
com os episódios atuais isso ficou mais acirrado e evidente. O que estaria por
trás de todo esse cerco midiático?
Ricardo Zúniga - O processo
bolivariano da Venezuela, liderado por Hugo Chávez, desde seu início, teve uma
forte repercussão na grande mídia nacional e internacional. As razões são
múltiplas: o fato de o projeto político da Venezuela ser portador de uma nova
alternativa para as maiorias empobrecidas da Venezuela e ter manifestado
fortemente interesse pela integração e unidade dos povos latino-americanos em
continuidade com os ideais de Bolívar. Depois do fracassado golpe de estado de
abril 2002, a grande mídia que representa e defende os interesses do capital,
sustenta mais fortemente uma posição política coincidente com o chamado
‘Consenso de Washington’, que nunca foi consensuado com os governos nem com os
povos da América Latina. Esta clara contradição política explica a parcialidade
e negatividade com que são apresentadas as notícias sobre o processo
bolivariano.
São
bem conhecidas as incidências do golpe de abril 2002, o sequestro do presidente
e retenção na base militar de Orchila, as pressões para que renunciasse, a
apresentação na mídia de uma falsa carta de renúncia, as manobras das grandes
corporações midiáticas para respaldar o golpe. No entanto, as forças populares
unidas ao setor das forças armadas leais ao legítimo governo liberavam ao
presidente e revertiam o golpe. A mídia pretendeu ignorar os fatos e se limitou
a transmitir música para entreter e distrair. Desta forma, se negaram a informar,
em quanto foi possível, sobre o admirável retorno de Chávez ao Palácio de
Miraflores na madrugada do 13 de abril.
Durante
o tratamento do câncer e convalescência do presidente Chávez, a partir de sua
primeira cirurgia em junho de 2011, frequentemente a grande mídia projetou a
ideia de que o presidente estaria afetado por um mal irreversível que
provocaria sua morte, em termos de horas ou poucos dias. Ainda que fosse real
que na primeira etapa de sua enfermidade (junho 2011 a fevereiro 2011) a informação
oferecida foi sucinta, a partir de sua cirurgia do 11 de dezembro 2011, os
comunicados oficias informaram de forma frequente sobre o estado geral do
presidente. Falavam da lenta recuperação do paciente, também de suas
complicações. Mas não entravam em detalhes. Os comunicados não tinham porque
satisfazer a curiosidade mórbida de quem procurou mostrar o cadáver a qualquer
custo. Mas o que alguns meios corporativos parecem procurar são detalhes e
imagens humilhantes para o presidente; isto parece se confirmar com a foto
publicada no jornal El País, no dia 23 de janeiro, em sua edição impressa e no
sítio web, de um homem entubado e em aparente estado terminal, afirmando ser
Hugo Chávez e comentando se tratar da realidade que o governo venezuelano quer
ocultar. Pela observação de internautas experientes se comprovou que a foto, já
tinha sido publicada no You Tube em 2008, e correspondia a uma pessoa parecida
a Chávez. O El País, uma vez denunciada a manobra, se viu obrigado a retirar de
seu sítio web e pedir desculpas.
A
publicação do jornal El País é simbólica, está refletindo uma total falta de
ética e de respeito aos leitores e a expectativa dos proprietários do grupo
midiático Prisa e dos que desejam terminar com o processo bolivariano. Apostam
que a morte de Chávez seria um golpe irrecuperável para o mesmo. Ante a
ausência da imagem que confirme sua expectativa de apresentar o moribundo,
fabricaram irresponsavelmente essa vulgar falsificação.
O
que está por trás deste cerco midiático, é que ante a debilidade de partidos e
organizações da oposição na Venezuela, e em vários países da América Latina,
como Equador, Bolívia, Nicarágua, a grande mídia Pró Consenso de Washington se
constitui em partido de oposição, e não procura informar sobre o que acontece,
mas destruir ao inimigo, atacar aos governos de signo popular. Neste sentido
são muito eloquentes reiterados depoimentos do presidente Rafael
Correa de Equador.
Em
síntese, trata-se de uma guerra aberta aos governos e movimentos populares e
sociais que representam a construção de caminhos viáveis alternativos ao
sistema de dominação neoliberal, sustentado pelos grupos capitalistas
especuladores que se articulam em torno as grandes potências da OTAN
[Organização do Tratado do Atlântico Norte] e seus aliados. Assim como os
setores dessa aliança têm impulsionado guerras de destruição do Iraque, Líbia,
de modo semelhante lançam a guerra midiática contra o governo da Venezuela e
todos os avanços da Alternativa Bolivariana para os Povos de Nossa América
[Alba], ao considera-lhe um mau exemplo. O mais grave é que esta guerra não
parece ter limites éticos, enquanto a mídia do grande capital faz este
trabalho, noutra frente, grupos da chamada inteligência planejam ações
como o assassinato de líderes políticos como o presidente Rafael Correa
Adital - Por outro
lado, esta mídia corporativa provocou uma resposta por parte dos governos e de
suas populações, que também se remodelou e se fortaleceu. Pode comentar sobre
isso?
Ricardo Zúniga - Devemos
acrescentar, que pelo fato de mentir e manobrar aberta e frequentemente alguns
meios corporativos estão perdendo influência e credibilidade, é o caso da
própria Venezuela, Equador, Bolívia, Argentina e México.
No
México, a grande mídia se envolveu diretamente na fabricação da candidatura de
Enrique Peña Nieto. Conseguiram ganhar nas eleições presidenciais de 2011, mas
tiveram que usar de procedimentos ilegais, como compra de votos, e a resposta
tem gerado o fortalecimento do movimento juvenil #132 que sustenta com forte
adesão dos jovens universitários e outros setores populares à ilegitimidade do
novo governo.
Outro
fator decisivo a favor das causas populares é o crescimento de sítios, boletins
de notícias e blogs que defendem a alteridade, outro mundo possível e vão
conquistando influência, audiência e credibilidade. Neste sentido o
posicionamento da Adital é representativo e alentador. O fato de ter mais de 2,
5 milhões de acesos mensais é um logro muito significativo.
Em
resumo, ante a fraqueza política dos partidos que representam o grande capital,
a mídia corporativa assume cada vez com maior clareza uma função de oposição
partidária, que defende abertamente os interesses de seus proprietários,
tentando apresentá-los como os interesses de toda a nação.
Na
Venezuela o processo bolivariano está conseguindo construir redes de
comunicação alternativa, e conquistando gradativamente audiência. É
significativo que o programa dominical "Aló, Presidente” (diálogo do presidente,
equipes de governo com o povo organizado) alcançou altíssimos níveis de
audiência, superando aos domingos a programação mais assistida da TV Comercial.
Estes avanços foram possíveis porque Chávez e a direção política do país não
temeram enfrentar as corporações midiáticas, e coerentemente se vem criando
tanto a nível federal, como estadual uma rede de estações de TV e rádios
comunitárias e populares, que estão informando sobre a vida do povo e suas
organizações. Completando os esforços das redes nacionais, se desenvolve no
âmbito continental a TeleSUL, produto da uma aliança dos países da Alba, mais a
Argentina e Uruguai.
Mas
ainda a grande mídia continua sendo hegemônica em audiência geral, porém há
crescimento claro da informação sobre os logros da revolução.
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