8 de fev. de 2013

Pescadores de homens

                                            Júlio Lázaro Torma*
                           " Avance para as águas mais profundas e lance as redes "  ( Lc 5,4)
  O Evangelho deste final de semana em que vamos ler, escutar e meditar nos fala da vocação dos discípulos e da " Pesca milagrosa" no lago de Genesaré.
   As comunidades lucanas nos contam este episódio da pesca milagrosa,única nos textos sinóticos.
   Jesus está a beira do lago de Genesaré, na região de Cafarnaum, pregando ao povo que estava ao seu redor, enquanto olha dois barcos a beira do mar.E manda lançar as redes.
  Para as comunidades de Marcos ( Mc 1, 14-20) e de Mateus ( Mt,18-22), nos apresentam a vocação dos discípulos antes da fama de Jesus e as comunidades de Lucas nos apresenta a vocação  dos discípulos depois da fama na Galiléia.
   Este texto é simbólico, acontece após o anúncio do programa de vida de Jesus em Nazaré (Lc 4,14-30),onde resume toda a vocação e missão da comunidade de Jesus até o fim dos tempos, onde " caminha nas estradas do mundo rumo ao céu".
  Os discípulos são chamados a lançar as redes, sair das margens do lago e ir para o meio do lago a onde está os cardumes de peixes.
  Assim como após a manhã de Pentecostes, a Igreja sai do cenáculo( At 2,1-13), e vai ao encontro do mundo de mais de diferentes povos e culturas da terra.
  Onde ela com a força da Palavra de Jesus e da ação do Espírito Santo, sai do seu mundinho e do comodismo e vai ao encontro de outras culturas e formas de pensamento.
  O mundo atual é o mundo da globalização e das diversidades, onde nós batizados temos medo de dar o nosso testemunho de vida e fé.
  O homem pós moderno nos interpela o nosso testemunho de vida, nós temos medo de ir ao seu encontro,acabamos escondendo a nossa identidade e ficamos no nosso círculo e pescando nas margens,enquanto os cardumes estão longe.
  Vivemos em diversos cenários que cada vez mais nos interpelá como os vastos bolsões de miséria, o mundo urbano,a diversidade cultural, religiosa, sexual, mídia,o mundo virtual e os avanços da tecnologia, da ciência e nas áreas da intelectualidade.
  Onde com medo e saudosismo de um passado em que o cristianismo era o alicerce da cultura e da civilização ocidental, temos medo desta abertura de nos embrenhar ao mundo do desconhecido do mundo novo.
  Este estranho mundo novo que ao mesmo tempo nos seduz e fascina pela sua diversidade e velocidade, acaba nos dando medo.Vivemos pensando em que o outro venha ao nosso encontro mas acabamos não indo ao seu encontro, ir dialogar e escutar o seu clamor e aspirações como clamava o macedônio a Paulo, " Vem em nosso auxilio!" ( At 16,9).
  Como discípulos e missionários, batizados somos obrigados a dar o nosso testemunho," Ai de mim se eu não evangelizar" ( I Cor 9,16).
  No local em que estamos na familia, local de moradia, mundo do trabalho, da política, das artes, mídia, comércio, lazer, estudo,saber usar a mídia e as ferramentas disponíveis na tecnologia, da informática na era da informação.
  Devemos fazer uma Nova Evangelização, com novos métodos e não com métodos antigos ultrapassados e saudosistas de tempos em que não voltam mais.
  Jesus nos interpela e manda " avançar", não ter medo do desconhecido, ao mesmo tempo ele nos anima a ir ao dizer " Estarei convosco" e " sejais revestidos da força do alto" (Lc 24,49), que animou a Vida e a Missão de Jesus e que nos anima hoje em nossa Missão de batizados, discípulos e missionários, pois a nossa missão é permanente.
  Como Igreja somos vacacionados a sermos missionários, pescadores de homens, pois se não formos missionários, somos tudo menos Igreja de JESUS CRISTO.
   " Tu vieste á margem do lago, não buscaste nem sábios, nem ricos, queres somente que eu te siga.
   Senhor,olhaste em meus olhos e sorrindo disseste meu nome.
   Là na areia deixei o meu barco e contigo vou buscar outro mar".
    Vamos rezar por todos os aniversariantes agradecendo ao Deus da Vida,pelas suas vidas.
    Dia 12 de Fevereiro ( Terça-Feira de Carnaval), de 2013
    36ª Romaria da Terra  em Bento Gonçalves/RS
" TERRA, VIDA E CIDADANIA"
 " TERRA E CIDADANIA:PRINCÍPIOS DO BEM VIVER".
Lc 5,1-11
______________________
   * Membro da Equipe Arquidiocesana da Pastoral Operária de Pelotas/ RS

7 de fev. de 2013

Os cabrais do Brasil

Quando os povos indígenas do Brasil imaginavam estar livres dos “Cabrais”, do início da invasão, até o data Constituinte de 1988, quando o então à época, deputado federal pelo (PMDB), Bernardo Cabral tentou eliminar os povos indígenas através do seu substitutivo, eis que ressurge outro Cabral, o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, também do (PMDB) para negar direitos indígenas. Sempre com nobres intenções: "civilizar, desenvolver, aculturar, “turismar”, até fazer estacionamento". E nesse jogo pra inglês ver, conforme afirma Romário, “vale tudo”. Até comunicados oficiais dizendo ser uma ofensa às aldeias indígenas, atribuir tal nome aos "indígenas invasores do prédio do ex-museu do índio".

É jogo duro. Os povos indígenas que o digam. A Copa do Mundo e as Olimpíadas estão aí no horizonte próximo. E aí vale tudo, ou quase tudo. Não é apenas um pequeno grupo de indígenas que estão ameaçados de remoção. Conforme matéria do The New York Times, em março do ano passado, "170 mil pessoas serão despejadas até Copa do Mundo e Olimpíadas" (FSP, 2/02/13).

O jogo duro do agronegócio

A capitã, Kátia Abreu, já está com o time em campo há muito tempo. Promete erradicar as "inseguranças jurídicas", o quanto antes. Afinal de contas eles são os donos do campo e da bola. Os Guarani-Kaiowá, Terena... que se cuidem. O jogo promete ser pesado. A treinadora espera contar com o apoio do Legislativo, Executivo e Judiciário.  Se não ganharem no campo, no tapetão será certo. E não tem tempo para esperar. Essa semana mesmo já terá um encontro de alto nível, conforme podemos constatar:

"Lideranças rurais dos estados do Paraná e do Mato Grosso do Sul, acompanhados pela presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), senadora Kátia Abreu, entregaram à presidente Dilma Rousseff um documento relatando a insustentável situação de insegurança jurídica vivida pelos produtores que tiveram suas propriedades invadidas por grupos indígenas e cidadãos paraguaios na fronteira do Mato Grosso do Sul e do Paraná, nos municípios de Iguatemi, Douradina, Itaporã, Paranhos, Tacuru, Coronel Sapucaia e Ambaí, além de Guaíra e Terra Roxa, respectivamente. A presidente da República determinou ao ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e à ministra chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, que recebam uma representação de produtores e a presidente da CNA, no próximo dia 7 de fevereiro, em Brasília, para tratar do assunto (publicado em 04/02/2013).

A solução conforme Kátia (Cabral) Abreu

"Para a presidente da CNA, é fundamental que o STF confirme o efeito vinculante das condicionantes do julgamento da Raposa Serra do Sul, ao julgar os embargos declaratórios impetrados junto ao tribunal. Somente assim, a AGU (Advocacia Geral da União) poderá reeditar a Portaria 303, convertendo as orientações do STF em ato normativo. Dessa forma, acredita que será possível restabelecer a segurança jurídica nas áreas rurais invadidas ou em conflito por ameaças de invasão. A senadora Kátia Abreu informou que visitará o STF na próxima semana, quando pretende “manifestar a sua preocupação com a questão" (publicado em 04/02/2013).

Os povos indígenas terão um jogo duro pela frente. Demarcar, garantir as terras e implementar políticas públicas condizentes será muito difícil, pois os estádios de futebol estão atrasados, os sistemas viários para o bom fluxo dos turistas estão devagar quase parando e alguns até já suspensos. E ainda vem os índios exigindo recursos para terras, saúde, educação, produção. Assim não vai ter gol. Mas a Secretaria Especial da presidência da República já assumiu a questão Kaiowá Guarani, como prioridade das prioridades. A questão agora é entrar em campo e fazer o gol.

Egon Heck
Povo Guarani Grande Povo
fonte: http://www.cimi.org.br/site/pt-br/?system=news&conteudo_id=6711&action=read

6 de fev. de 2013

Grandes projetos e grandes impactos

Inchaço das cidades, desmatamento, reordenação do território, incremento da violência, alcoolismo e uso de drogas, bem como da prostituição, especulação imobiliária, aumento de empresas prestadoras de serviço são alguns dos elementos que configuram a aquarela das cidades da Amazônia que abrigam alguma experiência de grande projeto. Uma visita do jornalista Rogério Almeida aos territórios de Carajás.
Juruti, pequena cidade do Baixo Amazonas, no estado do Pará passa por tal experiência por conta do extrativismo mineral da bauxita, sob a tutela da empresa estadunidense Alcoa.
O minério é matéria prima para a produção da alumina, que é transformada em alumínio. A mesma Alcoa mantém uma planta industrial na capital do Maranhão, São Luís. A energia elétrica é o principal insumo da empresa eletrointensiva.   
Na mesma cadeia produtiva a norueguesa Norsk Hidro mantém duas plantas industriais no município de Barcarena, no norte do Pará. Até pouco tempo a Vale foi a principal acionária da cadeia que aglutina minas, mineroduto e indústrias.  
Nas terras do Carajás, a sudeste do estado, ocorre uma abissal reestruturação do território por conta do incremento da cadeia de mineração da Vale. Uma passagem na cidade do minério, Parauapebas, que abriga a principal mina de ferro da Vale, prestes a cessar a exploração, impressiona a reconfiguração que experimentou a cidade nos derradeiros anos.
Não adentrava a cidade havia um tempo. Apenas passava pela principal via de acesso. Nesta semana tive a oportunidade de percorrer novas periferias, como o bairro Altamira. Pelo que me consta, não existia na década de 1990, quando conheci a região. Uma avenida principal cercada de ipês constituía a principal via.  Os hotéis eram modestos e as churrascarias a oportunidade de refeição e lazer.   
A periferia da cidade parece ter sofrido um aumento. Tal fenômeno sempre ocorre quando se anuncia um novo projeto de exploração mineral, construção de obras de infraestrutura, como o que ocorre na cidade vizinha, Canaã dos Carajás. E a duplicação da Ferrovia de Carajás, que desloca milhões de dólares em minério de Parauapebas até São Luís.
Os barracos de madeira proliferam entre ruas esburacadas, desprovidas de saneamento básico sob uma rede de energia marcada pela gambiara. A lógica do extrativismo dos recursos da Amazônia tende a gerar riqueza em outros rincões, interpretam os tradados da academia.
Nas terras dos Carajás é a Vale que estrutura, reestrutura, organiza e desorganiza os territórios em suas áreas de interesse. Como a abertura de novos frentes ela tem implantado rodovias, melhorado alguns acessos no interior dos locais de extração, subjugando territórios já estabelecidos. Isso tem ocorrido com nos projetos de assentamentos rurais, no sentido de possibilitar a implantação de ramais ferroviários e torres para a instalação de energia.
O tempo de capital urge, e não se coaduna com o tempo das lógicas camponesas do vasto leque da Amazônia: indígena, quilombola, assentado da reforma agrária. O capital a tudo devora, até mesmo da lentidão dos processos burocráticos, e exige a flexibilização dos marcos legais.  
A tecnologia de ponta da mega corporação não dialoga com práticas milenares de sobrevivência do homem do campo. É desigual a força dos entes envolvidos, dos projetos de desenvolvimento em jogo.
Em sua base a população é desprovida de informação suficiente que a qualifique para uma discussão mais profunda sobre o complexo xadrez da economia mundial, que linka o grotão ao resto do mundo.   
Lá no Brasil profundo, num território marcado pela anarquia fundiária disputam especuladores, fazendeiros, grileiros, camponeses e indígenas.  Na arena, existe gente de boa fé, com uma propriedade já constituída, e que lhe garante a reprodução econômica e social. Gente com quase três décadas fincadas na terra. Coisa dos tempos do Grupo Executivo das Terras do Araguaia-Tocantins (Getat), o Incra da ditadura em terras Amazônicas.
É tempo de chuva nas terras dos Carajás, tão distante de Brasília, alheia às ameaças de morte, ao dinamitamento de vidas inteiras na floresta tropical, ou no que resta dela.  É tempo de uma abissal alteração na ecologia econômica, social e política no belo Vale das terras dos Carajás.
Fonte: Rogério Almeida, Furo - rogerioalmeidafuro.blogspot.com.br - janeiro de 2013

5 de fev. de 2013

O Amor de Deus



Frei Mauro Alves da Rosa, ofmcap
054 96866390




Podemos falar de amor de várias formas: amor físico, amor platônico, amor materno, amor a Deus, amor à vida. O amor possui muitas conotações, mas essa diversidade de termos acaba criando uma dificuldade para definirmos o que é o amor. Isto ocorre não só nos idiomas modernos, mas também no grego e no latim.

O grego possui várias palavras para amor, cada qual denotando um sentido diferente e específico. No latim, encontramos amor, dilectio, charitas, bem como Eros, quando se refere ao amor personificado numa deidade, numa pessoa que se admira. Amar também tem o sentido de gostar muito e, sendo assim, torna-se possível amar qualquer ser vivo ou, até mesmo, um objeto.

Mas, qual a compreensão cristã sobre o amor?  A compreensão cristã é que o amor vem de Deus, porque Deus é amor, o amor é uma virtude teologal. O amor do homem e da mulher (éeros, em grego), bem como o amor altruísta (ágape), são frequentemente contrastados como um amor "ascendente" e "descendente", respectivamente. Mas, estes dois tipos de amor são, em última instância, a mesma coisa.

Não sei se existe uma teologia sobre o amor, mas existem teólogos e pensadores cristãos que escrevem sobre o amor. Os teólogos cristãos vêem Deus como fonte de amor, aquele espelhado no ser humano e em seus próprios relacionamentos amorosos. Entre esses especialistas, podemos citar C. S. Lewis, influente teólogo anglicano, que escreveu vários livros sobre o amor, especificamente o The Four Loves (Os quatro amores). O Papa Bento XVI, na sua encíclica Deus Caritas Est (ou seja, Deus é Amor), também pretendeu refletir sobre o amor divino para com o ser humano e a relação entre o ágape e o eros.

Falar de amor hoje em dia pode ser algo estranho, mas, o ser humano nasceu para viver no amor, para o amor e com amor. Quando se ama alguém, procura-se conhecer  sua vontade e cumpri-la.  Jesus Cristo deu-nos um mandamento novo que é de nos amarmos uns aos outros como Ele mesmo nos amou. Pois, é no amor de um ao outro que nos reconheceremos como discípulos de Jesus Cristo (Cf. Jo 13,34-35).

Nos evangelhos e especificamente no evangelho e nas cartas de João o acento principal é o amor. Na primeira carta, João escreve: “Caríssimos, amemo-nos uns aos outros, porque o amor vem de Deus, e todo aquele que ama nasceu de Deus e chega ao conhecimento de Deus. Aquele que não ama não chegou a conhecer Deus, pois Deus é amor. (1Jo 4,7-8)  O discípulo amado retoma o tema da caridade fraterna, pois é pela caridade que a comunidade vai ser reconhecida como discípula de Jesus. A caridade, e não a esmola. A caridade desprendida de toda ambição manifesta o amor de Deus entre os homens e no meio da comunidade. Todo cristão, toda a comunidade são “espelhos ou ‘portadores (as) de Cristo para os outros seres humanos (C.S Lewis).

Neste sentido, a caridade  “é um amor dirigido a um vizinho, alguma pessoa, que não possui nenhuma qualidade adorável que o objeto do amor possui. (C.S Lewis, In os Quatros Amores). Pela caridade, “mantém-se viva a esperança em meio às injustiças e adversidades.” (Documento de Aparecida nº 26).

Conforme Lewis, o cristianismo inverte a lógica: "o mundo não existe principalmente para que possamos amar a Deus, mas para que Ele possa amar-nos (C.S Lewis, In os Quatros Amores). E este Deus que nos ama caminha ao nosso lado. O Deus apresentado por Jesus é um Deus amoroso e com compaixão.

Assim, todo cristão deve “experimentar o amor de Deus de forma verdadeira e não ilusória, portanto, é experimentá-lo como nossa rendição à Sua exigência, nossa conformidade ao Seu desejo. (C.S Lewis, In os Quatros Amores). Ou seja, “Amar a Deus com todo o teu coração, mente e força e amar ao teu próximo como a ti mesmo (Marcos 12-31).

O amor de Deus pelo ser humano é como o amor do pai pelo filho mais novo que  esbanjou todos os bens em festas. Alegra-se com a volta do filho e faz festa. Assim sendo, podemos dizer que o amor de Deus é um “amor paciente”.

O amor é paciente, o amor não é invejoso, não é arrogante nem orgulhoso, nada faz de inconveniente, não procura o seu próprio interesse, não se irrita nem guarda ressentimento. Não se alegra com a injustiça, mas rejubila com a verdade. Tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. O amor jamais passará. (1Cor 13:4-8).

4 de fev. de 2013

“Salve Jorge”: da Palestina ou da Capadócia?

Leonardo Boff
No Brasil e alhures são milhões que veem novelas. Atualmente uma, “Salve Jorge”, se desenrola na Capadócia, Turquia, onde teria  vivido São Jorge.
Entre os estudiosos há uma antiga discussão sobre o lugar de seu nascimento. Ela vem largamente discutida por Malga di Paulo, pesquisadora da vida do santo e que forneceu os dados para a atual novela. Um livro seu deverá sair brevemente. Para Malga que conhece a fundo a Capadócia, todos os indícios levam àquele lugar como a pátria natal deste famoso mártir. Outros o colocam em Lod na Palestina, hoje Israel, onde se construiu um santuário em sua homenagem.
É muito pouco o que podemos dizer de forma segura sobre o tema. A escola de historiadores críticos da vida dos santos e dos mártires, surgida a partir  do século XVII, os Bolandistas, e sua obra a Acta Sanctorum deixa a questão em aberto. Outro grupo, criado  ao redor de A. Buttler, baseando-se nos Bolandistas e acessível em português em 12 volumes, A Vida dos Santos (Vozes 1984) assevera: ”Há toda uma série de motivos para se acreditar que São Jorge foi um mártir verdadeiro e real que sofreu a morte em Lida na Palestina provavelmente na época anterior a Constantino (306-337). Fora disso, parece que nada mais se pode afirmar com segurança”( vol. IV, p. 188).
Minha tendência é afirmar a Palestina e não Capadócia como o lugar de seu nascimento. A razão se prende ao fato de que teria havido uma confusão de nomes. Com efeito, havia na Capadócia um bispo chamado Jorge da Capadócia, fato historicamente bem atestado. Entrou na história da teologia, em razão das polêmicas acerca da natureza de Cristo: seria só semelhante a de Deus (arianos) ou seria a mesma (anti-arianos)? Tal discussão dividiu a Igreja.  O imperador Constâncio II (um de seus títulos era de Papa) queria assegurar a unidade do império mediante uma confissão  única, no caso, a ariana. Militarmente ocupou Alexandria, foco da resistência anti-ariana e impôs Jorge da Capadócia como bispo ariano (357-361), mais tarde assassinado. Isso consta até nos manuais de teologia.
Minha hipótese é que os primeiros compiladores da vida de São Jorge, já no século V e depois, no século XII, ;com o autor da Legenda Aurea, confundiram São Jorge com esse conhecido Jorge da Capadócia e assim o fizeram nascer ai. Uma hipótese.
Deixando a discussão de lado, importa lembrar sua figura mais conhecida: um guerreiro, montado sobre um cavalo branco, vestido de couraça, com uma cruz vermelha num fundo branco, enfrentando terrível dragão com sua lança pontiaguda.
Por seu pai ter sido militar, seguiu essa carreira. Foi tão brilhante que o imperador Diocleciano o incorporou à sua guarda pessoal com a alta patente de Tribuno. Quando este imperador obrigou todos os soldados cristãos a renunciarem a fé cristã e adorarem os deuses romanos, sob pena de morte, Jorge se recusou e saiu em defesa de seus irmãos de fé. Preso e torturado, miraculosamente passou, diz a lenda, ileso do caldeirão de chumbo e de vários envenenamentos. Mas acabou sendo decapitado.
No início, no Ocidente, era venerado apenas como um simples mártir com sua palma típica. Com tempo e especialmente devido às cruzadas foi feito guerreiro com seus instrumentos próprios, especialmente associado ao enfrentamento com o dragão, símbolo do mal e do demônio. A lenda mais conhecida no Ocidente é a seguinte:
Certa feita, Jorge, como militar, passou pela Líbia no norte da África. Na pequena cidade de Silene o povo vivia apavorado. Num brejo vizinho reinava terrível dragão. Se sopro era tão mortífero que ninguém podia se aproximar para mata-lo. Cobrava cada dia dois carneiros. Terminados estes, exigia vítimas humanas, escolhidas por sorteio. Um dia a sorte caiu sobre a filha do rei. Vestida de noiva foi ao encontro da morte. Eis senão quando, surge São Jorge com seu cavalo branco e com sua longa lança. Fere o dragão e domina-o. Amarra-lhe a boca com o cinto da princesa. Esta o conduz manso com um cordeiro até o centro da cidade. Todos, agradecidos, se converteram à fé crista.
É patrono da Inglaterra, já a  partir de 1222 mas oficialmente só em 1347 com Eduardo III com festa solene (the St.George’s Day), da Rússia, de Portugal, da Bulgária, da Grécia, da província da Catunha e de muitas outras cidades.
Uma polêmica se instaurou quando o Vaticano em 1969 fez uma revisão da lista dos santos e retirou dela  o popular São Jorge, por motivos não totalmente claros. Houve uma grita geral, especialmente, por parte da Inglaterra, da Catalunha e também do time de futebol, o Corinthians de quem é patrono. O Card. Dom Paulo Evaristo Arns, corintiano fervoroso, intercedeu junto ao Papa Paulo VI para que mantivesse a veneração de São Jorge, ao menos como  celebração optativa. Ao que o Papa respondeu: ”Não podemos prejudicar nem Inglaterra nem a Nação corintiana; prossigam com a devoção”. Em 2000 João Paulo II, com senso pastoral, restabeleceu a festa. Ele está presente nas tradições afro: Ogum para a Umbanda e Oxossi para o candomblé-nagô. No Rio, o dia 23 de abril, sua festa, é feriado municipal, pois é o patrono de fato da cidade.
No próximo artigo tentaremos decifrar o arquétipo de base que subjaz ao guerreiro São Jorge e ao dragão. Enquanto isso, fazemos nossa a oração popular: ”Andarei vestido e armado com as armas de São Jorge para que meus inimigos, tendo pés não me alcancem, tendo mãos, não me peguem e tendo olhos não me enxerguem…E meus inimigos fiquem humildes e submissos a Vós. Amém”.
fonte:http://www.franciscanos.org.br/

3 de fev. de 2013

Pela vida


A tragédia de Santa Maria é um clarão espantoso, que deve brilhar como um relâmpago para inquietar mentes, corações e consciências, transmitindo o sentido e alcance da responsabilidade cidadã de cada um (Foto: AFP)

A tragédia numa boate de Santa Maria, que matou e feriu tantos jovens, instiga o coração de todos. De modo especial, desenha um horizonte que a sociedade contemporânea precisa considerar. A vida não pode ser vivida e tratada simplesmente como lógica de ganho de coisas. A vida é mais. Não basta simplesmente conferir, por força legal e dever profissional, a validade de alvarás de funcionamento. A tragédia aponta para irresponsabilidades nos procedimentos de profissionais e de proprietários com aquilo que está posto a serviço de todos.
Na verdade, o funcionamento social reclama de governantes, de profissionais e de cidadãos comuns um tratamento mais adequado de tudo e de cada coisa, especialmente daquilo que é público. Essa é uma questão que deve encontrar raízes na cultura, ancorada por legislações, normas e procedimentos. Também, e acima de tudo, relaciona-se à formação da consciência de que é fundamental o respeito irrestrito à vida de cada pessoa. Sem esse sentido norteador, os atrasos em obras públicas continuarão. E o manejo do dinheiro público não vai se livrar dos interesses espúrios, da ganância dos que precisam levar sempre mais vantagem sobre o que é bem de todos. A consequência será a vida posta em risco.

As mortes nas estradas, por exemplo, que não são duplicadas ou sofrem com a falta de manutenção, atingem números de guerra. De fato, um verdadeiro descaso quando a inteligência acomoda-se na mediocridade e não se consegue sair das burocracias que obstruem os processos. Quem tem o poder de decisão, de corresponder à demanda em favor da vida de todos, não enfrenta os desafios diários de transitar em estradas que não atendem mais, de se deslocar em transportes que usurpam horas do descanso e do convívio familiar de tantos.

Descasos de cá e de lá, interesses financeiros gananciosos e a venenosa visão egoísta da vida, segundo o princípio de que conta é tão somente o bem e o conforto próprios, vão alastrando uma cultura que valida prestação de serviços de segunda classe, morosidades, usufrutos indevidos ou indiferença diante dos outros, especialmente dos que precisam mais. O resultado é desastroso para uma sociedade que tem a oportunidade de alçar um patamar de maior qualidade de vida para todos, mas que ainda padece com atrasos. E o prejuízo maior e mais sofrido será sempre dos mais pobres, dos indefesos e inocentes.

A tragédia de Santa Maria é um clarão espantoso, que deve brilhar como um relâmpago para inquietar mentes, corações e consciências, transmitindo o sentido e alcance da responsabilidade cidadã de cada um. Não basta o alívio de quem não teve um jovem próximo e amado envolvido nesta tragédia. Não basta pensar que o ocorrido foi longe da própria cidade e da própria casa. Os riscos em potencial, por irresponsabilidades, morosidades e interesses gananciosos, alcançam todos, nos mais diversos lugares.

Onipotência para controlar tudo, tudo prever e evitar, ninguém tem. O que todos precisam ter é a responsabilidade profissional, governamental e cidadã de construir uma cultura pela vida. Trata-se de uma postura pessoal contracenando, obviamente, com os funcionamentos das cidades, bairros, vilas, condomínios, ambientes públicos e da própria casa. Uma postura pessoal que fará diferença, sempre. A cultura, os governos, os cidadãos, os profissionais, todos são desafiados a compreender que o progresso e o desenvolvimento integral não são alcançados quando se desconsidera o valor da vida.

Dom de Deus, a vida há de ser respeitada em todas as suas etapas, da fecundação à morte com o declínio natural. Qualquer relativização abre as portas para permissividades, irresponsabilidades e descasos. Tarefa fundamental para que cada um reconheça a vida, de todos, como dom, é cultivar a espiritualidade - pela oração, silêncio, meditação, diálogo com Deus, vivência comunitária e comprometimento social. Esse caminho é fonte de saúde, de sensibilidade ética e moral, do gosto pela promoção e defesa da vida de todos. Sem espiritualidade, atrasaremos processos e não avançaremos no compromisso pela vida.

Dom Walmor Oliveira de Azevedo O arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, Dom Walmor Oliveira de Azevedo, é doutor em Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Gregoriana, em Roma (Itália) e mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma (Itália). Membro da Congregação do Vaticano para a Doutrina da Fé. Dom Walmor presidiu a Comissão para Doutrina da Fé da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), durante os exercícios de 2003 a 2007 e de 2007 a 2011. Também exerceu a presidência do Regional Leste II da CNBB - Minas Gerais e Espírito Santo. É o Ordinário para fiéis do Rito Oriental residentes no Brasil e desprovidos de Ordinário do próprio rito. Autor de numerosos livros e artigos. Membro da Academia Mineira de Letras. Grão-chanceler da PUC-Minas.
fonte: http://www.domtotal.com/colunas/3362

2 de fev. de 2013

Pesquisas do Fórum de Davos e do WWF permitem traçar cenários para 2013


Fórum Econômico Mundial divulga relatório sobre o Índice de Confiança Econômica, enquanto o WWF lança levantamento sobre empresas que investem em energia limpa.
Por Jorge Abrahão*
O Fórum Econômico Mundial reunido em Davos, na Suíça, divulgou os resultados do Índice de Confiança Econômica, uma pesquisa feita com 390 especialistas que avaliou o teor de confiança em relação a cooperação, economia e governança global.
O item dessa pesquisa que mais causou preocupação foi o relacionado à governança global, em que mais da metade dos entrevistados alegou ter pouca ou nenhuma confiança e apenas 14,6% disseram estar otimistas. Quando se trata de governança global, a responsabilidade não é apenas do governo, mas também das grandes empresas e de líderes de uma forma geral.
Outro ponto que discute sobre líderes é o quesito referente à cooperação global, em que apenas 24,6% dos entrevistados disseram confiar.
No Brasil, ao contrário do que ocorre em outros países, os empresários estão sendo vistos com bons olhos. Outra pesquisa realizada no Fórum de Davos colocou o país em quarto lugar no quesito “otimismo dos executivos”. O Brasil foi citado por 15% dos 1.330 presidentes como um dos três mais importantes países para o crescimento das empresas.
Esses dados colocam em discussão um grande desafio para 2013, que é o de criar lideranças mais confiáveis. Necessitamos de uma governança global adequada, que tenha em mente os preceitos do desenvolvimento sustentável e esteja comprometida com eles. Esse compromisso é a única forma de reverter a crise econômica que vivemos atualmente. O Brasil está em posição de destaque e podemos atribuir isso ao fato de que é um dos países que mais investem em energias renováveis e em projetos sociais.
E as empresas têm um papel fundamental em criar essas lideranças. E é necessário que elas tenham em mente o que comentamos tantas vezes: o desenvolvimento sustentável. Para que criar uma liderança confiável é preciso mostrar à sociedade seu comprometimento com o futuro e com seus impactos sobre sociedade e o meio ambiente. É preciso ações que diminuam tais impactos e mostrem o quanto a empresa está disposta a evoluir, desde que não prejudique a sociedade e o meio ambiente.
WWF: empresas e energias renováveis
Nesse caminho de se criar uma liderança confiável que rume para o desenvolvimento sustentável, uma pesquisa do WWF chamada Energia Adiante: Por Que as Maiores Empresas do Mundo Estão Investindo em Energia Renovável mostrou que, no que tange às emissões, as empresas estão indo bem. De acordo com a pesquisa, seis em cada dez das maiores empresas do mundo estão investindo em energia renovável, com metas para reduzir as emissões de dióxido de carbono (CO2), metano e outros gases de efeito estufa, com o uso de fontes de energia limpa, como painéis solares.
O relatório concluiu que as práticas de energia renovável estão se tornando padrão e preocupação para algumas das empresas mais rentáveis do mundo. Além disso, 14% dessas companhias criaram metas específicas para usar energia limpa.
No Brasil, um exemplo de iniciativa empresarial que temos é o Fórum Clima – Ação Empresarial sobre Mudanças Climáticas, que tem contribuído para o avanço da agenda de clima em nosso país. Criado para acompanhar os compromissos da Carta Aberta ao Brasil sobre Mudanças Climáticas, o Fórum Clima é composto por empresas e organizações que acreditam que o setor empresarial pode dar uma contribuição decisiva à necessária transição mundial para uma economia de baixo carbono, aproveitando novas oportunidades de negócio e, ao mesmo tempo, reduzindo significativamente os impactos negativos das mudanças climáticas globais sobre o planeta. O grupo conta com a participação de 17 empresas e duas organizações apoiadoras. O Instituto Ethos é responsável pela secretaria executiva do projeto.
Uma das ações do Fórum Clima foi criar uma meta de redução de emissões nas indústrias da construção civil, a qual foi assumida pelo Grupo de Trabalho Engenharia e Construção Civil, liderado por construtoras como a Andrade Gutierrez, a OAS, a Camargo Corrêa e a Odebrecht. As empresas publicaram o inventário de suas emissões de GEE e as monitoram com a meta de reduzi-las em 30% até 2030. Uma oportunidade para alcançar essa meta está em construções verdes que incorporem a sustentabilidade em sua gestão.
Esperamos que essas ações se espalhem para outros setores e que as empresas invistam cada vez mais em projetos que tragam benefícios tanto econômicos quanto para  ambientais e sociais.
* Jorge Abrahão é presidente do Instituto Ethos.
fonte: http://www3.ethos.org.br/
28/1/2013