Por Marcelo Gleiser*
O respeito à vida como verdade universal leva a um estado em que agimos como os guardiões dela
Está na hora de irmos em frente e deixar para trás o desgastado embate entre a ciência e a religião, que já não rende nada. É preciso encontrarmos um novo rumo, ir além da polarização linear que vem caracterizando as discussões do papel da fé e da razão na vida das pessoas por mais de cem anos. A ciência não se propõe a roubar Deus das pessoas, e nem toda prática religiosa é anticientífica. Existe uma outra dimensão a ser explorada, ortogonal a esse eixo em torno do qual giram os argumentos mais comuns.
Um caminho possível é explorar valores morais de caráter universal que desafiem a linearidade do cabo de guerra entre a ciência e a religião.
Bem sei que, para muita gente, a proposta de encontrar valores morais universais representa já um beco sem saída. Relativistas culturais, por exemplo, argumentarão que esses valores universais não existem, que o que é certo para um pode ser errado para outro. Por exemplo, culturas nas quais a poligamia é aceita.
Para encontrar valores morais universais, precisamos ir mais fundo. Não podem ser valores que variem de cultura para cultura ou em épocas diferentes, como a ideia do casamento. Sugiro que o valor mais efetivo que podemos explorar vem da única certeza universal que temos: a morte.
A morte não é recebida com prazer em nenhuma cultura. Claro, alguns veem a morte como uma transição para uma nova vida, ou um mero aspecto de uma existência sem fim. Outros podem até vê-la como um ato heroico de martírio. Mas, tirando fundamentalistas radicais, ninguém em boa saúde física e mental escolhe morrer. Portanto, de todos os valores morais que podemos imaginar, proponho que o mais universal seja a preservação da vida.
Não me refiro apenas à vida humana. Quando percebemos o quanto nossas vidas dependem do planeta que habitamos, damos-nos conta de que precisamos agir para preservar todas as formas de vida. É óbvio que temos que garantir nossa existência, e que isso requer que consumamos alimentos. Mas esse consumo não precisa ser predatório. Pode ser planejado para que mantenha um equilíbrio saudável entre o que é produzido e o que é consumido.
Quanto mais saudável o planeta, mais saudável a economia. Isso pode não ser óbvio a curto prazo, mas em intervalos de décadas é. Este é o século em que finalmente iremos entender que precisamos estabelecer uma relação simbiótica com a Terra. Talvez essa seja a lição mais importante que a ciência moderna tem a ensinar.
O respeito à vida como moral universal leva a uma ecologia espiritual na qual nós, como espécie dominante do planeta, agimos como guardiões da vida. Com isso, a dimensão espiritual que nos é tão importante ganha expressão na devoção ao planeta e às suas formas de vida.
Esse senso de conexão espiritual com a natureza é celebrado tanto na ciência quanto na religião. De Einstein a Santa Teresa de Ávila (grato a Frei Betto, por me chamar atenção para esta obra), o mundo é festejado como sacro. As palavras variam, mesmo a motivação pode variar; mas, em sua essência, a mensagem é a mesma. Acho difícil encontrar uma moral universal mais básica do que o respeito à vida e ao planeta que a abriga de forma tão generosa. Ao menos, é um começo.
Um caminho possível é explorar valores morais de caráter universal que desafiem a linearidade do cabo de guerra entre a ciência e a religião.
Bem sei que, para muita gente, a proposta de encontrar valores morais universais representa já um beco sem saída. Relativistas culturais, por exemplo, argumentarão que esses valores universais não existem, que o que é certo para um pode ser errado para outro. Por exemplo, culturas nas quais a poligamia é aceita.
Para encontrar valores morais universais, precisamos ir mais fundo. Não podem ser valores que variem de cultura para cultura ou em épocas diferentes, como a ideia do casamento. Sugiro que o valor mais efetivo que podemos explorar vem da única certeza universal que temos: a morte.
A morte não é recebida com prazer em nenhuma cultura. Claro, alguns veem a morte como uma transição para uma nova vida, ou um mero aspecto de uma existência sem fim. Outros podem até vê-la como um ato heroico de martírio. Mas, tirando fundamentalistas radicais, ninguém em boa saúde física e mental escolhe morrer. Portanto, de todos os valores morais que podemos imaginar, proponho que o mais universal seja a preservação da vida.
Não me refiro apenas à vida humana. Quando percebemos o quanto nossas vidas dependem do planeta que habitamos, damos-nos conta de que precisamos agir para preservar todas as formas de vida. É óbvio que temos que garantir nossa existência, e que isso requer que consumamos alimentos. Mas esse consumo não precisa ser predatório. Pode ser planejado para que mantenha um equilíbrio saudável entre o que é produzido e o que é consumido.
Quanto mais saudável o planeta, mais saudável a economia. Isso pode não ser óbvio a curto prazo, mas em intervalos de décadas é. Este é o século em que finalmente iremos entender que precisamos estabelecer uma relação simbiótica com a Terra. Talvez essa seja a lição mais importante que a ciência moderna tem a ensinar.
O respeito à vida como moral universal leva a uma ecologia espiritual na qual nós, como espécie dominante do planeta, agimos como guardiões da vida. Com isso, a dimensão espiritual que nos é tão importante ganha expressão na devoção ao planeta e às suas formas de vida.
Esse senso de conexão espiritual com a natureza é celebrado tanto na ciência quanto na religião. De Einstein a Santa Teresa de Ávila (grato a Frei Betto, por me chamar atenção para esta obra), o mundo é festejado como sacro. As palavras variam, mesmo a motivação pode variar; mas, em sua essência, a mensagem é a mesma. Acho difícil encontrar uma moral universal mais básica do que o respeito à vida e ao planeta que a abriga de forma tão generosa. Ao menos, é um começo.
*Marcelo Gleiser, professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro "Criação Imperfeita".
Fonte: don total
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