Por ocasião da Jornada Mundial das Missões, uma reflexão sobre o radical repensar dos fundamentos teológicos da missão, graças ao concilio.
Fonte: Zenit.org
Pe. Giuseppe Buono, PIME
Em 11 de outubro de 1962 começou o concílio Vaticano II,
convocado pelo papa João XXIII. Passaram-se já 51 anos. Pelo mundo
inteiro, surgiram iniciativas para comemorar o aniversário: congressos,
assembleias, reuniões, documentos, livros, edições exclusivas de
periódicos repletas de contribuições de vários especialistas, filósofos,
teólogos, historiadores, sociólogos. Um grande interesse midiático. E
em todas essas informações, grandes ou pequenas, mesmo nas de fonte
estritamente laica, há um consenso geral em se reconhecer a importância
do concílio Vaticano II: um evento extraordinário, o primeiro concílio
da história da Igreja de caráter plenamente universal, como nunca tinha
acontecido. Para o mundo católico, é um evento que tem implicações
espirituais elevadíssimas, a tal ponto que o Sínodo Extraordinário dos
Bispos em 1985 o chamou de "graça máxima do século XX".
A teologia da missão no Concílio Vaticano II
O concílio ecumênico Vaticano II lança uma reformulação radical do
fundamento teológico da missão. O termo e o conceito de missão tinha
sido expresso, de quando em quando, como atividade missionária da
Igreja, como plantatio Ecclesiae, como uma atividade da Igreja
onde quer que houvesse necessidade ou apenas como atividade nos
territórios dependentes da Congregação De Propaganda Fide.
O decreto Ad Gentes recupera a visão da missão em termos de
ontologia sobrenatural. A missão da Igreja é fundada nas missões
trinitárias: no Pai como amor originário que envia o Filho, Sua Palavra,
e o Espírito Santo. A reflexão sobre a missão é teológica pelo seu
conteúdo e pelo específico modo com que especialmente os Padres gregos
distinguiam a teologia (Deus em si mesmo Trino e Uno e a criação) da economia
(especialmente a Encarnação). A Igreja é a realização do plano de Deus
de salvar todas as pessoas, associando-as à sua vida e à sua glória. A
vida da Trindade é, ao mesmo tempo, a fonte da missão da Igreja e o seu
cumprimento no horizonte escatológico. O início do decreto Ad Gentes ressalta: "Ad gentes divinitus missa...", onde o divinitus
não fala apenas de um mandado divino, mas remete a uma fonte que é a
própria vida da Trindade; não é apenas um Deus que envia, mas um Deus
que entra no coração da humanidade para salvá-la.
Natureza da Igreja e natureza da missão
Existe uma íntima relação entre a natureza da Igreja e a missão da
Igreja. A relação íntima está contida na atribuição à Igreja da
categoria de mistério e de sacramento, que remetem ao horizonte bíblico e
ao da Tradição.
A Igreja é mistério em relação ao mistério de Cristo e ao mistério da
Santíssima Trindade, à sua origem e, consequentemente, à sua missão.
A Igreja é mistério porque é fundada no mistério trinitário; é sociedade porque está enraizada na história.
A Igreja é sacramento porque é resultado da redenção operada por
Cristo e é chamada a atualizá-la na história dos homens por força da
Encarnação do Verbo.
Natureza e missão da Igreja se exigem e se expressam reciprocamente:
"A Igreja peregrina é, por natureza, missionária, uma vez que se origina
da missão do Filho e da missão do Espírito Santo, de acordo com o
desígnio de Deus Pai" (AG 2).
A Igreja é povo de Deus a caminho do cumprimento. Esse caminho é
histórico e salvífico ao mesmo tempo, porque o tempo do homem é
projetado para a eternidade de Deus.
O vocabulário da missão no concílio Vaticano II
O vocabulário da missão no concílio Vaticano II coloca a missão da
Igreja dentro das missões trinitárias, enfatizando a iniciativa do Pai,
fonte de Amor, de Cristo, missionário do Pai, e do Espírito Santo, que
torna a Igreja missionária. Considerando-se a Igreja e a humanidade na
sua historicidade como destinatárias das missões trinitárias, segue-se
que a Trindade é o modelo de referência permanente da missão da Igreja,
cujo objetivo é participar a todos os homens a vida trinitária da qual
deriva a sua própria missão. "A missão não se limita a suscitar a
conversão e a fé, mas também norteia os passos seguintes que levam ao
batismo, à vida da Igreja e ao testemunho no mundo. A missão pretende
iniciar, fazer crescer e sustentar o caminho da fé que, desde o primeiro
momento, leva à plenitude de Cristo".
No decreto Ad Gentes, a expressão mais utilizada não é
missão, mas atividade missionária, como sinônimo de missões e do
conjunto das tarefas da Igreja (AG 9). Além disso, o subtítulo do
decreto conciliar, sobre a atividade missionária da Igreja, expressa com
clareza a intenção dos padres conciliares. Esta missão, no entanto,
continua mesmo após a fundação da Igreja nos ambientes de incredulidade e
de ignorância do mistério de Cristo e nas Igrejas de origem antiga,
onde "a Igreja está em fase de regresso e de fraqueza" (AG 19).
Encontramos assim, no decreto, uma terminologia que indica toda a missão que a Igreja recebeu de Cristo: missio Ecclesiae,
e, juntamente, toda a atividade missionária da Igreja dedicada aos
gentios, isto é, aos grupos não cristãos que ainda não foram alcançados
pelo anúncio do Evangelho e aos lugares em que a Igreja não se expressa
ainda em plenitude: activitas missionalis
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