"Até o leilão, o
Brasil tinha 100% do maior campo do pré-sal. A partir de então, tem no
máximo 40%", disse o coordenador-geral da Federação dos Petroleiros.
Foto: Fernando Frazão/ABr
Privatização do campo de Libra, ganha pelo
consórcio que juntou as multinacionais francesa Total, a anglo-holandesa
Shell, as chinesas CNPC e CNOOC e a própria Petrobras, é duramente
criticada por trabalhadores e especialistas, que questionam cálculos da
Agência Nacional de Petróleo sobre lucro do Estado.
Por Cida de
Oliveira, da Rede Brasil Atual
O leilão do campo de Libra, realizado na tarde de segunda-feira (21) no
Rio de Janeiro, foi comemorado pelo governo. A participação da
Petrobras, de 40% sobre o petróleo explorado, e os cálculos da Agência
Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) de que o
Estado ficará com 73% dos lucros do bloco do pré-sal, é vista como um
resultado positivo pela administração Dilma Rousseff.
No entanto, a realização do leilão e o seu resultado foram alvos de
críticas de trabalhadores e especialistas. Para o coordenador-geral da
Federação Única dos Petroleiros (FUP), João Antônio de Moraes, o país
ficou 60% mais pobre. "Até o leilão, o Brasil tinha 100% do maior campo
do pré-sal. A partir de então, tem no máximo 40%", disse.
"A entrega de 60% de Libra para as empresas estrangeiras é um dos
maiores crimes de lesa-pátria que já tivemos no país. Um dia triste para
o povo brasileiro", lamentou. "O leilão foi um fiasco e o governo ainda
comemorou".
Além dos 40% da Petrobras, o petróleo será divido entre a francesa
Total (20%), a anglo-holandesa Shell (20%) e as chinesas CNPC e CNOOC
(10% cada). O consórcio pagará 41,65% do excedente de óleo bruto ao
Estado brasileiro. Além disso, as empresas tiveram de depositar R$ 15
mil milhões para poder participar do leilão.
Para Moraes, o facto de a Petrobras ficar com 40% do campo – 30%
assegurados pelas regras do edital mais os 10% de participação no
consórcio vencedor – não chega a acalmar os ânimos daqueles que
defendiam a exploração exclusiva pela Petrobras como prestadora de
serviço.
De acordo com ele, a FUP irá debruçar-se detalhadamente sobre o edital e
contratos em busca de alternativas jurídicas ainda cabíveis para anular
a licitação. Outra ação será a de promover campanhas educativas para a
população. "O brasileiro tem de passar a entender de petróleo e gás para
não vir a ser lesado como foi hoje", disse.
Menos para a educação
O consultor da Câmara dos Deputados para Assuntos de Petróleo e Gás
Paulo César Ribeiro Lima questionou os cálculos da ANP. De acordo com
ele, com base no edital do leilão, a participação da União será muito
menor do que o anunciado, podendo chegar a 9,93% (de 41,65%) caso o
valor do barril de petróleo caia no mercado internacional e a
produtividade da produção de Libra também seja reduzida.
Para ele, esse cenário não é tão improvável assim, uma vez que a
produção mundial pode ser elevada principalmente pelo aumento da
produção americana de Shale oil, categoria de óleo extraído do xisto
betuminoso. Além do mais, o preço do barril já chegou a R$ 60,00 e a
produção já caiu a menos de 4 mil barris diários.
"Pelas regras, a remuneração de 41,65% é calculada numa perspetiva de
produção de 12 mil barris por dia, cada um no valor entre 100 e 120
dólares. Se ambos subirem, o percentual sobe para 45,56%. Mas se caírem,
pode chegar a 9,93%", afirmou. "Quem perde com isso é a educação, que
receberá 75% dos royalties, e a saúde, que ficará com 25%.". Os royalties correspondem a 15% do valor do barril.
Essa matemática, conforme Lima, chega a ser mais desfavorável ao país
do que num regime de concessão. "Por esse regime, Libra pagaria perto de
40% independentemente da produção e do preço do barril".
Segundo Lima, as regras estabelecidas para o leilão de Libra são
diferentes daquelas do regime de partilha de outros países. "Se Libra
fosse na Noruega, o governo norueguês ficaria com mais de 60% da
produção, e não as empresas; aqui não houve leilão, e sim um acordo
entre a Petrobras, que é mais privada que estatal, com 53% de capital
social estrangeiro, e as companhias multinacionais."
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, saiu em defesa do modelo e disse
que o governo não pretende promover mudanças para os próximos leilões,
que devem ocorrer apenas a partir de 2015. "Como nós estamos falando de
grandes somas de investimentos, e também de grande capacidade
tecnológica, isso limita um pouco a participação", disse. “[Outras
empresas] não devem ter participado por questões estratégicas, ou têm
outros investimentos a fazer, ou não cabia no portfólio, ou não julgaram
interessante. Cada empresa é que deve dizer. Mesmo que seja um
consórcio, mas ele foi um consórcio com várias empresas e é
perfeitamente satisfatório.”
Coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel
Cara entende que o resultado do leilão não chegou a surpreender e ficou
bem abaixo da necessidade de recursos para a educação. "Infelizmente o
governo não conseguiu acertar um valor maior para o maior campo. Apesar
da riqueza que ele trará, estimulando toda a cadeia produtiva do
petróleo e gás, não podemos esquecer o retorno que deixaremos de obter",
disse.
Para o conselheiro do Clube de Engenharia Paulo Metri, embora a União ganhe com os royalties que
serão arrecadados com a licitação e produção do campo de Libra, perde
porque a maioria (60%) dos lucros ficarão com as empresas estrangeiras.
"Foram criadas regras que permitiram que o consórcio, e não a União,
fique com a maior parte dos lucros."
Para Metri, o facto de a Petrobras ficar com 40% da participação só é
positivo num panorama em que a estatal ficasse de fora. "Porém, é ruim,
quando a Petrobras poderia ter ficado 100%", disse, destacando o artigo
12 da Lei 12.351, de 2010, que permite à União contratar a petroleira
nacional sem licitação em caso de preservação do interesse nacional e ao
atendimento dos demais objetivos da política energética.
Além disso, conforme nota divulgada pela Petrobras, a estatal deverá
desembolsar R$ 6 mil milhões referentes à sua participação no consórcio
para o pagamento de um bónus de assinatura do contrato no valor de 15
mil milhões de reais, que deverá ser pago em parcela única.
Fonte; Brasil de Fato
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