16 de nov. de 2010

«Se amamos o Criador, devemos amar a Criação»

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Entrevista do Patriarca Ecumênico Bartolomeu I a Paulo Sotero, enviado especial de O ESTADO DE SÃO PAULO a Istambul - Turquia
Bartolomeu I, Patriarca Ecumênico de Constantinopla fala sobre lado espiritual da ecologia e reconhece dificuldades do diálogo de reconciliação com a Igreja Católica
  Por que seu interesse pela Amazônia?
Patriarca Bartolomeu: — Sabemos que há uma preocupação mundial com a Amazônia. Queremos conhecer e aprender. E queremos oferecer nossa perspectiva e contribuir para o diálogo que leve à solução dos problemas. O simpósio em si não trará nenhuma solução. Mas acreditamos que a participação de especialistas de diferentes disciplinas e países, bem como de formuladores de políticas, facilitará o entendimento, pois trará ao debate as dimensões científica e espiritual da ecologia.
O que o senhor espera alcançar com o simpósio?
Patriarca Bartolomeu: — Nosso objetivo não é resolver todos os problemas ecológicos, mas sensibilizar as pessoas, criar consciência ecológica. É obrigação sagrada da igreja proteger a criação, de acordo com a vontade do Criador. Essa é a razão, em última análise, pela qual o Patriarcado Ecumênico decidiu abraçar esse trabalho. Achamos que é nosso dever. Atuamos em colaboração com a Igreja Católica, que é a maior das denominações cristãs, o que aumenta a eficácia dos nossos esforços e seu impacto junto aos fiéis. Se dizemos que respeitamos e amamos o Criador, temos então que respeitar e amar sua criação.
O Brasil é o país que tem o maior número de católicos batizados. A reconciliação das Igrejas Católica e Ortodoxa acontecerá um dia?
Patriarca Bartolomeu: — Será um longo caminho. Temos um fosso criado por uma separação de nove séculos e meio. Iniciamos um diálogo há quase 50 anos, quando o papa Paulo VI e o patriarca Atenágoras tiveram um encontro histórico na cidade de Jerusalém, ao final do Concílio Vaticano II. Levantaram-se as excomunhões mútuas que as igrejas haviam decretado. O diálogo teológico começou depois da visita do papa João Paulo II ao Patriarcado, em 1979. No entanto, a comissão mista formada para estudar os pontos de diferenciação dos dois sistemas, com o objetivo de chegar a um consenso, entrou em crise depois de 20 anos de trabalho.
Por quê?
Patriarca Bartolomeu: — O problema gira em torno das igrejas ortodoxas do movimento uniata, que seguem Roma. Elas mantêm os paramentos e ritos litúrgicos das igrejas orientais mas estão unidas a Roma. Os ortodoxos acreditam que os chamados ritos orientais foram uma invenção de Roma para fazer proselitismo junto aos cristãos do leste. Os nossos irmãos católicos romanos dizem aos ortodoxos que não são teologicamente educados, que não há diferença substancial entre as igrejas, que a diferença está só nas roupas, e que se trata apenas de mencionar o nome do papa de Roma na liturgia, porque somos todos o mesmo povo.
E não é assim?
Patriarca Bartolomeu: — O entendimento ortodoxo é que esse não é um argumento honesto e sincero. Depois do colapso do comunismo, várias das igrejas uniatas que seguem Roma passaram a desfrutar de mais liberdade e assumiram atitudes agressivas em relação aos ortodoxos. Houve uma reação forte e o diálogo parou.
Em setembro passado convoquei os representantes de todas as igrejas ortodoxas e propus a retomada do diálogo, que foi aceita. Roma também concordou. Em setembro próximo haverá, em Belgrado, a primeira reunião plenária da comissão de 30 teólogos ortodoxos e 30 teólogos católicos. O tema será a estrutura da igreja.
Qual é a maior diferença?
Patriarca Bartolomeu: — É a posição hierárquica do bispo de Roma na estrutura geral da igreja cristã e isso nos leva ao principal obstáculo em nossas deliberações. Nós, ortodoxos, dizemos que o papa tem a primazia do amor e da honra. A Igreja Católica afirma que o papa tem também a primazia de jurisdição sobre toda a igreja cristã e pretende que isto seja um direito divino, enquanto que nós entendemos que se trata de um direito criado pelos homens.

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