5 de jan. de 2012

Trabalho e Humildade


                              Júlio Lázaro Torma*

   Estava numa reunião  de pastoral, quando foi lido e refletido o Evangelho de Lucas 14,1.7-11; onde relata o almoço de Jesus na casa de um notável de seu tempo e conta uma admoestação de Jesus sobre o comportamento da pessoa.
   "Quando fores convidado ás bodas, não te sentes no primeiro lugar, pois pode ser que seja convidada outra pessoa de mais consideração do que tu, e, vindo o que te convidou, te diga:
 Cede o lugar a este.Terias então a confusão de dever ocupar o último lugar.Mas, quando fores convidado vai e tomar o último lugar, para que,quando vier o que te convidou, te diga:" Amigo, passa mais para cima.Então serás honrado na presença de todos os convivas.Porque todo aquele que se exaltar será humilhado,e todo aquele que se humilhar será exaltado".
  Na partilha da Palavra, havia uma eminente senhora de um movimento eclesial,que ficou escandalizada,assim como muitas pessoas,ficam escandalizadas,quando falo do meu trabalho.
  " Trabalho como reciclador", me respondem:" como pode tu com toda esta bagagem intelectual estas catando lixo, lá não é o teu lugar".
  Eis que ao trabalhar como reciclador ou catador, vi e percebi a solidariedade das pessoas humildes, irmãos e companheiro/as de trabalho para comigo.Os pobres na qual me dediquei de corpo e alma, em servi-los no trabalho pastoral ou militância social,pessoas que não professam a mesma crença do que eu.Na hora em que eu mais precisava, foram os primeiros á me estender a sua mão e solidariedade.
  Nestes dias no meu trabalho ao chegar numa residência fomos ofendidos pelo dono da casa que nos chamou de " vagabundos", como já vi pessoas humildes, falarem com desprezo e dizerem que não vão" trabalhar de lixeiro".
  Nos anos de 1970-1989, no ensino fundamental, na 1º série, havia uma cartilha imposta pela ditadura militar que dizia para as crianças:
  "Pedrinho estudou e virou doutor e Joãozinho não estudou e virou lixeiro".Onde a profissão de lixeiro é desprezada e colocada como sendo inferior e para pessoas inferiores.
  Ao trabalhar no meio dos catadores e recicladores, vivo na prática concreta a " Opção preferencial pelos pobres", sindo me cada vez mais franciscano.Mesmo não sendo franciscano, sou como escreve os teólogos José Arregi, José Maria Castillo e José Maria Diez-Alegria Gutierrez ( 1911-2010), " sou um franciscano ou jesuíta sem papeis( sem documento).
  Como fez São Francisco de Assis, na sua prática de vida, " no meio de gente comum e desprezada, de pobres e fracos, enfermos e leprosos e mendigos de beira de estrada"( São Francisco de Assis; Regra Não Bulada).
  Na humildade deste trabalho, quero educar os meus futuros filhos, a valorizar o trabalho, pois mesmo o trabalho mais humilde e desprezível, como o do gari, catador, faxineiro,como o do agricultor,pedreiro e pescador, tem o mesmo valor do que tem aquele que tem o curso superior como o médico, professor,arquiteto,advogado,engenheiro,jornalista ou do empresário, pois todo o trabalho está interligado.
  Diferente do que foi imposto na mentalidade de toda uma geração de brasileiros e brasileiras pelo regime militar e atualmente pela mídia.
  O humilde trabalho do gari, do reciclador, tem hoje, sem desprezar as outras categorias profissionais um valor muito importante, no cuidado de nossas cidades, bem como da preservação da vida no planeta.
   Pois como nos mostra o filme " Lixo Extraordinário", documentário da inglesa Lucy Walker e coodirigida pelos brasileiros Karen Haley e João Jardim, sobre a vida de trabalhadores do aterro sanitario de Duque de Caxias (RJ).
  O material transformado em lixo pela sociedade consumista se converte em fonte de vida de milhares de pessoas.Ser reciclador é ter orgulho de poder salvar a vida do planeta e o entregar as futuras gerações que são de fato os donos do planeta.
" Porque todo aquele que se exaltar será humilhado, e todo aquele que se humilhar será exaltado" .
  * Membro da Equipe da Pastoral Operária ( Arquidiocese de Pelotas/ RS)

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